01/04/2015

Intervenção da Deputada Municipal do PEV, Cláudia Madeira, na Declaração Política sobre o estado da saúde na cidade de Lisboa


Assembleia Municipal de Lisboa, 31 de Março de 2015 
«Os Verdes» escolheram para a declaração política de hoje o tema da saúde em Lisboa.

O que se passa em Lisboa não é diferente do que se passa por todo o país: tempos de espera infindáveis nas urgências dos hospitais, listas de espera intermináveis para as cirurgias, utentes que vão para a porta dos centros de saúde de madrugada na esperança de conseguirem marcar uma consulta e, muitas vezes, nem conseguem, milhares de utentes sem médico de família e sem qualquer perspectiva de conseguirem que lhes seja atribuído um, hospitais que encerram como o Hospital de Arroios, do Desterro, de São Lázaro e Miguel Bombarda, hospitais que perdem valências como o Hospital Curry Cabral e o Pulido Valente.

E não ficamos por aqui. Temos ainda os constantes ataques ao Hospital Dona Estefânia, à Maternidade Alfredo da Costa e aos Hospitais da Colina de Santana e grandes, grandes carências a nível de cuidados de proximidade, situação que é ainda mais grave quando falamos de uma população envelhecida e com necessidade de cuidados especiais.

A rede de cuidados continuados é manifestamente insuficiente e os poucos serviços que existem estão a ser entregues à Santa Casa da Misericórdia, numa clara desresponsabilização por parte do Estado das suas funções sociais. Esta situação deveria funcionar como um complemento e não como uma forma do Estado se descartar das suas obrigações.

Depois, por outro lado, temos o Governo a querer convencer-nos que o tal Hospital Oriental de Lisboa, que não se sabe quando vai ser construído nem entrar em funcionamento, vai resolver os problemas e as necessidades na área da saúde em Lisboa, mas não vai. Até porque das poucas coisas que se sabe é que o número de camas será muito inferior ao que é necessário.

Mais, a construção deste equipamento nunca poderá servir de pretexto para fechar mais hospitais na cidade.

Temos, em Lisboa, uma clara falta de capacidade de resposta, uma situação dramática e visível aos olhos de todos, uma desumanização na forma como os utentes são tratados porque o Governo desinveste de forma brutal no Serviço Nacional de Saúde, e este problema não se passa só no serviço de urgências, que é a parte mais visível, mas também nos serviços de retaguarda.

A saúde mental em Lisboa viu reduzida a sua capacidade em número de camas e no atendimento ambulatório, condicionando gravemente a qualidade de resposta.

Uma das soluções encontradas foi, não investir no SNS, mas desviar as listas de espera para os hospitais privados porque, afinal, estes precisam de “clientes” para sobreviver.

Enfim, podemos caracterizar a situação que se vive hoje no país e em Lisboa como uma situação da maior insensibilidade por quem tem responsabilidades pelas políticas de saúde. Sem nos esquecermos, obviamente, dos sucessivos Orçamentos de Estado que assumem uma opção política clara de desinvestimento no SNS, com impactos muitos negativos e dramáticos na vida da população.

Neste momento, uma coisa é certa, pagamos mais pela saúde mas temos menos saúde.

Também a situação dos trabalhadores não pode fugir a este rol de críticas porque há falta de pessoal, os profissionais da saúde são empurrados para as reformas antecipadas, fazem escalas com mais horas do que é permitido, quando os contratos acabam vão para a rua e são substituídos por pessoas que estão desempregadas e que, muitas vezes sem formação ou vocação, exercem funções específicas por meia dúzias de tostões.

Mas muito têm feito os trabalhadores e os utentes em defesa do Serviço Nacional de Saúde, muito têm lutado pela manutenção dos notáveis resultados e da excelente qualidade que, mesmo assim, com todas estas ofensivas, o SNS consegue ter. São também eles que têm lutado para que a Saúde continue a ser um direito de todos, independentemente das condições socioeconómicas, porque este é um dos grandes méritos que o SNS trouxe.

É importante nunca nos esquecermos que o serviço público é um direito, e o privado é uma opção de quem quer e de quem pode. Não pode haver uma única pessoa que deixe de ter cuidados de saúde por não ter condições económicas. Enquanto isso acontecer estamos perante uma sociedade sem justiça social, o que é completamente inaceitável e vai contra os princípios consagrados na Constituição da República Portuguesa.

Os cortes a que temos assistido na saúde são imorais e desumanos e rejeitamos esta visão de encarar a saúde como um negócio.

No meio disto tudo, qual é o papel da Câmara Municipal de Lisboa? É esta a situação que o Partido Socialista pretende para a cidade de Lisboa?

Com esta declaração política pretendemos, por um lado, alertar para a situação insustentável que se vive na cidade de Lisboa a nível dos cuidados de saúde e, por outro lado, sugerir e reivindicar da autarquia um papel mais activo na defesa de mais e melhores serviços de saúde, porque como estamos, estamos mal e não acreditamos que nenhum executivo se orgulhe de ter os problemas que acabámos de descrever, e que afectam as pessoas no dia-a-dia, no seu município.

Portanto, consideramos que é altura do Partido Socialista assumir uma posição firme e clara em defesa do Serviço Nacional de saúde, não permitindo mais encerramentos de hospitais nem perda das suas valências. É altura do Partido Socialista se juntar à luta dos trabalhadores e dos utentes do SNS que se esforçam todos os dias para manter a qualidade dos serviços e do atendimento, apesar do pesadelo que vivem diariamente.

Propomos, por isso, que o Partido Socialista na Câmara Municipal de Lisboa, adopte uma posição contra as privatizações, os benefícios e favorecimentos a grupos privados de saúde, como aconteceu recentemente com o Grupo Espírito Santo Saúde na venda do Quartel do Colombo, ou no Grupo Mello, no caso do Triângulo Dourado, em Alcântara.

«Os Verdes» consideram que isto é o mínimo que o partido que governa a cidade pode fazer: ter uma posição que defenda os seus munícipes e o seu direito ao acesso à saúde e que condene firmemente e que não pactue com políticas que permitem que utentes morram nos hospitais sem assistência e que doentes crónicos deixem de ter acesso aos medicamentos mais adequados e mais eficazes.

O objectivo desta declaração política e aquilo que propomos é que o executivo defenda a saúde em Lisboa, que trabalhe em prol de melhores serviços para os utentes e os trabalhadores, e que não pactue com negociatas nem com atentados à saúde na cidade de Lisboa.

Porque Lisboa e os lisboetas merecem esta seriedade e este compromisso. 

Cláudia Madeira
Grupo Municipal de “Os Verdes

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