03/12/2015

Dia Internacional das Pessoas com Deficiência - Intervenção de Sobreda Antunes no debate “Vida independente”





Os Verdes” consideram o Movimento Vida Independente (MVI), como “uma filosofia e um movimento que trabalha em prol do respeito pela auto-determinação, dignidade e direito a uma cidadania efectiva das pessoas com deficiência”.
Destaque-se, em primeiro lugar, que este princípio, que representa um anseio de muitas pessoas com deficiência, não expressa qualquer desejo de isolamento por parte destas pessoas nem a ideia de que não necessitam de apoios.
O MVI distingue-se do carácter mais normativo do Movimento dos Direitos das Pessoas com Deficiência, centrando-se na responsabilidade da sociedade e não exclusivamente no indivíduo, pugnando pela capacitação das próprias pessoas e das suas famílias, no sentido de as acompanhar sempre que necessário, ajudando-as a cultivar um espírito de iniciativa e autonomia que lhes permita ganhar a confiança e a auto-estima necessárias para a sua auto-afirmação.
Em segundo lugar, há aqui que estabelecer uma distinção entre os conceitos de “Vida Autónoma” que significa atribuir a uma pessoa a capacidade de gerir e agir com amplitude decisória, porém fora do seu controlo; e de “Vida Independente” quando se reconhece a uma pessoa a liberdade e a responsabilidade de decidir e controlar os meios disponíveis para ela própria agir e intervir em sociedade.
Sendo uma abordagem consagrada na Convenção Internacional para os Direitos das Pessoas Com Deficiência, defendida pela União Europeia, encontra-se prevista na Estratégia Nacional para a Deficiência, mas não implementada sob responsabilidade governamental, apesar de tal ter sido prometido em 2013 pelo então Secretário de Estado da Segurança Social.
No caso de Lisboa, o Projecto Piloto de Vida Independente resulta de uma iniciativa do Pelouro dos Direitos Sociais da CML e do movimento e dos técnicos da equipa do projecto que o sustentaram, sob a coordenação do Jorge Falcato, para responder à necessidade de concretização do direito à vida independente.
O MVI exige o mesmo grau de autodeterminação, de liberdade de escolha e de controlo sobre a vida quotidiana, incluindo a oportunidade de fazer opções sobre onde morar, com quem e como viver, permitindo a contratação de um assistente pessoal em detrimento de uma institucionalização. Ou seja, em vez do internamento em instituições, a CML possibilita a oferta de condições, que deveriam ser da responsabilidade do Estado, para que as pessoas dependentes de terceiros possam ter mais apoio nas suas próprias residências, apoiando-as financeiramente, permitindo-lhes desse modo contratar um assistente pessoal.
As experiências e projectos desenvolvidos internacionalmente demonstram que, quando existe vontade da pessoa, é possível que ela não dependa, exclusivamente, da sua família ou de ser institucionalizada. Decidir como se vive, nas mais pequenas e elementares tarefas diárias (almoçar, higiene pessoal, sair de casa, etc.) representa uma questão de independência que importa garantir para todos os cidadãos que para tal tenham capacidade.
Foi neste contexto que o Pelouro dos Direitos Sociais da CML apresentou um projecto piloto desta natureza no final de 2014, que apesar de ser em pequena escala, poderá funcionar como uma mais-valia para o futuro, na criação de um sistema funcional, eficaz, que responda a estas necessidades.
Em síntese, o que foi na altura perspectivado e apresentado publicamente e à AML como benefícios para os participantes no projecto?
- Maior autonomia pessoal, exercício da autodeterminação e tomada de decisões;
- Providenciar apoio às actividades da vida diária;
- Providenciar apoio no trabalho, formação e actividades culturais, bem como no relacionamento social e participação em actividades associativas;
- Capacitar indivíduos e famílias para ficarem na sua residência e meio social, evitando a necessidade de institucionalização;
- Reduzir o esforço que implica, para as famílias, cuidar de uma pessoa com deficiência.
Diz-se na p. 19 deste Projecto Piloto, que os destinatários “serão pessoas com deficiência, com limitações físicas que lhes impeçam a realização autónoma de tarefas da vida diária como, por ex., deitar/levantar, tratar da higiene pessoal, preparação e confecção de refeições, alimentar-se, etc. Sendo um projecto de iniciativa municipal, e dada a escassez de meios existentes, será de considerar a integração de 5 a 10 pessoas no Projecto Piloto, dependendo no entanto da dimensão do financiamento existente ou que resulte de futuras parcerias”.
Mais à frente, na p. 23, afirma-se que, de acordo com esse projecto inicial, a CML comprometeu-se a, durante 2 anos, “assegurar a totalidade do financiamento necessário à implementação e funcionamento do Projecto Piloto” (substituindo-se ao inactivo Estado), bem como “dinamizar a mobilização de financiamento externo à CML, nomeadamente da Administração Central, de um próximo quadro comunitário de apoio e mecenático”.
Estimou-se ainda que, “de acordo com os cálculos efectuados, relativos ao pagamento dos Assistentes Pessoais, esta verba não deverá ultrapassar os 13 mil euros anuais por utilizador. Este cálculo é baseado numa média de 8 horas diárias de assistência por utilizador (240 horas por mês)”, pois não era na altura possível “determinar as exactas necessidades de assistência dos futuros participantes no Projecto Piloto”.
Temos no entanto algumas dúvidas sobre o que terá então entretanto acontecido. Permitam-nos que façamos aqui algumas contas.
Sabemos hoje que, no mês passado (de acordo com o Público de 22/11/2015), foi feita a selecção dos cinco felizes contemplados e que o município e o Centro de Vida Independente (CVI) assinaram um protocolo de colaboração que prevê a transferência para o segundo de 152 mil € e a disponibilização de “até três fogos municipais”, destinados a beneficiários do projecto que tenham necessidade de uma habitação.
Ora, se a verba não deveria ultrapassar os 13 mil euros anuais por utilizador e foram seleccionados 5, pelos nossos cálculos daria um total de 65 mil €, como foi apresentado na CML e garantido à AML, e não os actuais 152 mil €. Depois também estava previsto um total de 240 horas de assistência mensal, mas agora as 5 pessoas seleccionadas identificaram, no total, a necessidade de ter o apoio de assistentes pessoais em 659 horas por mês.
Pareceria ainda, numa lógica de justiça social, que para o pelouro dos Direitos Sociais da CML seria relevante que os seleccionados fossem também pessoas de grandes carências financeiras. Se o serão ou não nós não o sabemos.
Mas sabemos que sobre o ‘Projecto Piloto Vida Independente’, a AML deliberou por unanimidade em 17/3/2015, através da sua 6ª Comissão, recomendar à CML para que:
- estabelecesse os contactos necessários na procura de parceiros que garantam a continuidade do projecto;
- garantisse que os resultados do projecto-piloto fossem amplamente divulgados, permitindo que se alterem tendências, mudem paradigmas e sobretudo se adeqúe a legislação a estas necessidades;
- fossem contactadas a Santa Casa da Misericórdia e a Segurança Social por forma a que ocorresse uma troca de experiências e apoios; e
- que a AML fosse regularmente informada do desenvolvimento do projecto.
Ora a comunicação desta informação não Minho foi feita à AML, nem, de acordo com a Informação Escrita do sr. Presidente que vamos analisar e debater no próximo dia 15/12, o Departamento para os Direitos Sociais, p. 89 a 99, bem como o seu anexo com errata, nada referem sobre qualquer iniciativa da CML sobre este Projecto Piloto de Vida Independente, o que deveras se estranha.
Os Verdes” gostariam, finalmente, de ser esclarecidos sobre: Porque foram alterados os tempos e valores de apoio neste projecto piloto? Serão os beneficiários pessoas também realmente financeiramente necessitadas? Requereu a CML ao Governo ou à União Europeia, ao longo de 2015, iniciativas e contributos para garantir o desenvolvimento futuro do projecto? Porque nada reporta o pelouro na Informação Escrita que vai ser analisada dentro de dias?
Este projecto não constitui hoje – Dia da Pessoa com Deficiência – um ponto de chegada, mas sim um caminho de partida para uma participação activa, ao qual desejamos as maiores felicidades.

J. L. Sobreda Antunes, Partido Ecologista “Os Verdes”, 2015-12-03

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